A Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização, no valor de R$ 3 mil, à atendente trans de uma farmácia em Belo Horizonte, que não teve o nome social retificado em todos os sistemas utilizados pela empresa. A decisão é da juíza titular da 18ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Solange Barbosa de Castro Amaral.
A trabalhadora contou que, após a retificação oficial do nome e do gênero, informou à empregadora, solicitando a atualização do nome nos registros da empresa, no final do ano de 2023. Explicou que pediu a abertura de um chamado no sistema da empregadora.
Passados alguns meses, ela contou que a solicitação na empresa não foi atendida. Disse que foi realocada para outra loja, ocasião em que abriu um novo chamado, solicitando novamente a alteração do nome civil para o nome social. Disse judicialmente que o antigo nome continuou sendo utilizado pela empregadora, inclusive em sistemas gerenciados por ela, como o portal do colaborador, o programa de benefícios e registro de pontos, “o que tem lhe causado diversos constrangimentos, cotidianamente”.
Na defesa, a empregadora sustentou que “(…)jamais houve negativa ou resistência para alterar os dados funcionais da autora da ação”. Segundo a empresa, ela fez a retificação do nome no crachá funcional e no sistema workplace logo após a abertura do primeiro chamado. Ela ainda orientou a vendedora a confirmar a alteração nas autoridades competentes. Explicou que o primeiro chamado foi cancelado pela própria profissional e que a reclamação trabalhista foi distribuída antes que fosse processado o segundo chamado.
Para a juíza Solange Barbosa de Castro Amaral, o desrespeito à identidade da reclamante, na condição de pessoa transgênero, demanda uma análise sob a perspectiva de gênero, nos termos da Recomendação nº 128/2022, do Conselho Nacional de Justiça. Segundo ela, a norma faz alusão ao Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, de aplicação obrigatória no âmbito do Poder Judiciário, conforme previsto pela Resolução nº 492/2023, do Conselho Nacional de Justiça.
Dados do processo mostram que a profissional foi admitida pela empresa em 16/2/2023, com o nome civil. Em 14/11/2023, foi publicada a sentença deferindo a alteração do nome civil. Antes que os documentos pessoais fossem retificados, ela solicitou à empregadora a alteração do nome em 5/1/2024. No dia 17/4/2024, a trabalhadora foi transferida para outra loja do empregador.
Ao analisar o teor das conversas de WhatsApp mantidas entre a atendente e o técnico de TI, a julgadora observou que a trabalhadora informou que a alteração do nome ainda não havia sido feita até aquele momento. E que, em função da mudança de loja, havia aberto um novo chamado.
“Por sua vez, o técnico de TI informou que fecharia o primeiro chamado, e o 2º chamado foi então aberto no dia 05.05.2024. Em 15.07.2024, o segundo chamado teria sido resolvido, havendo registro de que os acessos estavam ok”, pontuou a juíza, salientando que a empregadora finalizou o chamado um dia antes do ajuizamento da reclamação trabalhista.
Para a julgadora, ficou comprovado que, embora a empregadora tenha tomado algumas providências, após a primeira solicitação formal, não houve um esforço corporativo convergente e eficiente para retificar o nome em todos os sistemas sob sua responsabilidade, sem qualquer tipo de ressalva.
“E tanto é assim que a autora teve que dar início a dois chamados distintos com a mesma finalidade e que, apesar de a empresa afirmar terem sido solucionados, o cupom de descontos emitido pela própria farmácia, em 10/07/2024, demonstra que a empregada ainda estava cadastrada com o nome civil”, ressaltou.
A juíza Solange Barbosa de Castro Amaral concluiu que os ajustes realizados não foram suficientes para evitar que a autora fosse submetida ao constrangimento de ter o antigo nome exposto perante os colegas de trabalho e clientes. “A empregadora não teve diligência na solução devida”.
Segundo a julgadora, nas relações de trabalho, é obrigação do empregador garantir o direito fundamental à segurança e à saúde física e psíquica dos empregados (artigo 157 CLT combinado com o artigo 200 VIII e 225 da Constituição), devendo adotar políticas efetivas de inclusão e diversidade para as pessoas trans.
“No caso, restou comprovado o decurso de tempo significativo entre a comunicação formal à empregadora e a efetiva retificação do nome, comprometendo o reconhecimento da identidade de transgênero expressamente manifestada pela reclamante”, concluiu a juíza, determinando a indenização de R$ 3 mil.
Quanto ao valor da indenização, a juíza considerou na decisão o tempo de serviço na empresa, a natureza pedagógica da pena, a gravidade da ofensa e as possibilidades econômicas do ofensor. Ressaltou ainda que a punição não deve servir para o enriquecimento da ofendida, “mas sim para desestimular o ofensor a prosseguir no rumo tomado”. Não houve recurso. Ao final, a juíza celebrou um acordo entre as pessoas envolvidas. A empresa já cumpriu o acordo e o processo foi arquivado definitivamente.
O dia 17 de maio marca uma data fundamental na luta por direitos humanos e igualdade: o Dia Internacional Contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia. Essa data convida toda a sociedade a refletir sobre os preconceitos que ainda afetam milhões de pessoas LGBTQIAPN+ em todo o mundo.
A escolha desse dia tem um simbolismo poderoso. Em 17 de maio de 1990, a Organização Mundial da Saúde retirou oficialmente a homossexualidade da sua lista de doenças. Desde então, esse marco passou a representar a importância de combater a ideia de rotular as identidades como doença e de reafirmar que orientação sexual e identidade de gênero não são desvios, mas expressões legítimas da diversidade humana.
Apesar dos avanços conquistados nas últimas décadas, muitas pessoas LGBTQIAPN+ ainda enfrentam discriminação em diversos espaços — no trabalho, nas escolas, nos serviços de saúde e até mesmo dentro de casa. Em alguns países, amar alguém do mesmo sexo ou ser uma pessoa trans ainda pode custar a liberdade, o emprego ou até a vida.
Por isso, o 17 de maio é um dia de resistência, mas também de visibilidade, escuta e acolhimento. É o momento de reconhecer os desafios enfrentados por essa população e, principalmente, de reafirmar o compromisso coletivo com uma sociedade mais justa, onde todas as pessoas possam viver com dignidade, respeito e segurança, independentemente de quem são ou de quem amam.
Promover o respeito às diferenças não é apenas um gesto de empatia — é uma exigência ética de qualquer sociedade democrática.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 12.05.2025
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