No dia da foto do crachá, a mulher, aprovada em todas as etapas do processo de admissão, foi comunicada de que a vaga “não estava mais disponível”
Uma mulher transgênero deverá receber R$ 37 mil de indenização de uma rede de supermercados que desistiu de empregá-la, mesmo após ela ter sido aprovada em todas fases do processo seletivo e assinado o contrato de trabalho. A decisão foi tomada pela 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC), que considerou que a negativa estava relacionada à identidade de gênero da trabalhadora, caracterizando discriminação.
O caso aconteceu em Tubarão, sul do estado. De acordo com o que foi relatado no processo, a mulher entregou seu currículo para a vaga de repositora e, na sequência, foi aprovada na entrevista, submetendo-se ao exame admissional.
Enquanto isso, a ré abriu uma conta bancária no nome da trabalhadora, com a intenção de realizar o depósito do salário. No entanto, ao se dirigir à empresa para tirar a foto do crachá, a mulher foi informada por um representante da rede de que não havia mais vaga disponível.
Na primeira instância, o juízo responsável pelo caso na 1ª Vara do Trabalho de Tubarão não reconheceu a discriminação e negou o pedido de indenização.
Ele considerou que não havia provas suficientes que ligassem a negativa de emprego na última fase do processo à condição de transgênero da reclamante. Isso porque, em sua análise, a empresa sabia da identidade de gênero da requerente durante todo o processo admissional.
Inconformada com o desfecho, a autora recorreu ao tribunal, reiterando seus argumentos. Na 1ª Turma, a relatora do caso, desembargadora Maria de Lourdes Leiria, optou por modificar a decisão anterior.
“Acontece que o procedimento de admissão é complexo, requerendo várias etapas, cuja realização de cada uma até a decisão final de contratação não significa que estão sob a competência da mesma pessoa”, explicou a magistrada.
A relatora complementou que a comprovação das etapas concluídas pela autora e a subsequente negativa, associada à sua identidade de gênero, configuravam discriminação, de acordo com o artigo 1º da Lei 9.029/95.
O acórdão ainda ressaltou que a reclamada não compareceu ao processo para se defender. Isso resultou na aplicação de “revelia e confissão ficta”, de acordo com o artigo 844 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), presumindo-se verdadeiros os fatos alegados na petição inicial.
Como resultado da conduta da ré, ficou estabelecido que a trabalhadora deveria ser indenizada por danos morais na quantia de R$ 30 mil.
Lourdes Leiria ressaltou que a dispensa não apenas frustrou o “direito social ao trabalho”, mas também afetou a dignidade da autora enquanto pessoa, aspectos garantidos pela Constituição Federal.
Além disso, a ré deverá pagar R$ 7 mil a título de danos materiais, correspondentes ao lucro cessante decorrente da promessa não cumprida. Isso porque, ao abrir a conta bancária e dar sequência ao processo de admissão, a rede de supermercados efetivamente criou uma expectativa legítima de vínculo empregatício. A frustração dessa expectativa resultou em perdas financeiras que, conforme a legislação, são passíveis de compensação.
Não cabe mais recurso da decisão.
Visibilidade Trans
O Dia Nacional da Visibilidade Trans é celebrado no Brasil nesta quarta-feira (29/1), promovendo reflexões sobre os direitos e desafios enfrentados por essa população.
Embora tenha havido conquistas, como a permissão do nome social em documentos e concursos públicos, dados recentes revelam que as pessoas transgênero continuam a enfrentar obstáculos em áreas como violência e acesso ao mercado de trabalho.
De acordo com uma estimativa do Banco Mundial de 2020, cerca de 1,9% da população brasileira, ou aproximadamente 4 milhões de pessoas, é composta por indivíduos transgêneros ou não binários. No entanto, apenas 4% das pessoas trans e travestis estão empregadas no mercado de trabalho formal e apenas 0,02% têm acesso ao ensino superior, como apontam dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra).
Em 2023, as oportunidades de emprego para profissionais transgêneros caíram 57% em comparação ao ano anterior, segundo levantamento da plataforma TransEmpregos.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 12ª Região Santa Catarina, por Carlos Nogueira, 29.01.2025
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