Entre conquistas legais e barreiras cotidianas, a inclusão mostra que acessibilidade beneficia não apenas pessoas, mas toda a sociedade
20/9/2025 – No dia 21 de setembro, celebra-se o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência, data que convida à reflexão sobre direitos e inclusão no Brasil. Apesar de avanços importantes e de um conjunto sólido de leis que protegem essa população, o mercado de trabalho ainda impõe barreiras que vão além das arquitetônicas, como o preconceito e a falta de oportunidade. Cada emprego, no entanto, significa mais do que a ocupação de uma vaga. É a possibilidade de revelar talentos, ampliar a autonomia e transformar ambientes. O impacto não se limita a quem chega: alcança toda a coletividade, que passa a conviver em espaços mais justos e diversos.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 14,4 milhões de brasileiros e brasileiras têm algum tipo de deficiência, o que corresponde a 7,3% da população com dois anos ou mais. No entanto, em 2024, o país registrava apenas 545.940 pessoas com deficiência e reabilitadas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) inseridas no mercado formal de trabalho, segundo levantamento do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os dados revelam uma grande lacuna entre o que a lei prevê e a realidade vivida por essas pessoas.
A Constituição Federal garante dignidade e igualdade de condições para todas as pessoas. Além dela, normas específicas reforçam a proteção:
Apesar da base legal, o cumprimento ainda enfrenta obstáculos.
A procuradora do Trabalho Danielle Olivares Corrêa, coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação do Trabalho (Coordigualdade) do Ministério Público do Trabalho (MPT), explica que a instituição atua de forma repressiva e promocional. “O MPT investiga denúncias contra empresas que não cumprem a cota ou não garantem ambientes de trabalho acessíveis. Quando há descumprimento, buscamos a assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC). Se houver recusa, ajuizamos ação civil pública para assegurar a aplicação da lei”, detalha.
Danielle lembra que a discriminação começa ainda nos processos seletivos, já que a maioria nem sequer é acessível e adaptada às necessidades das pessoas com deficiência. “Também não são fornecidos a quem for contratado recursos de tecnologias assistivas ou adaptações razoáveis no ambiente de trabalho. Com isso, muitas vezes esse trabalhador fica isolado, sem atividade ou fazendo tarefa diferente da sua formação profissional, o que acaba gerando o seu desligamento. A maior queixa é a falta de comunicação adaptada e de treinamento acessível.”
Segundo a procuradora, o maior entrave é cultural. “Estamos imersos em uma cultura estruturalmente capacitista. Embora tenhamos grandes avanços legislativos, com um arcabouço jurídico bastante robusto e protecionista dessa população, nos deparamos com argumentos de toda ordem para evitar essas contratações pelas empresas”.
Para além da perspectiva institucional, histórias pessoais mostram como a inclusão pode transformar trajetórias. A criadora de conteúdo e empreendedora Luiza Habib, uma mulher com deficiência, recorda seu primeiro dia como estagiária em uma multinacional. Luiza tem uma doença rara que afeta sua mobilidade.
“A chefe me disse que não iria determinar o que eu podia ou não fazer, mas que estava animada para ver como trabalharíamos juntas. Essa postura me tirou os limites pré-estabelecidos e me mostrou inúmeras possibilidades, sempre com responsabilidade. Descobri que sou muito mais capaz do que imaginava. Além disso, ela me deu liberdade para identificar quais eram minhas reais necessidades no laboratório, sem impor soluções ou presumir o que seria melhor para mim antes que eu mesma dissesse”, lembra.
Atualmente, Luiza está à frente da Acessibilizei, empresa de planos de aculturamento ESG, publicidade e produtos sobre acessibilidade. Junto da irmã, uma mulher sem deficiência, ela trabalha com o desenvolvimento da cultura inclusiva dentro das empresas. “A transformação mais urgente é simplesmente começar a aplicar a inclusão sem medo. É abrir espaço, investir em acessibilidade e entender que sempre dá para melhorar. Esse acesso precisa ser visto como direito, não como custo extra.”
Ela lembra ainda que a acessibilidade gera benefícios coletivos. “Na indústria de cosméticos, adaptações feitas por minha causa — como mudanças no refeitório e nos banheiros — melhoraram a vida de todos os colaboradores. A presença de pessoas com deficiência no ambiente de trabalho estimula a inovação, inspira soluções diferentes e contribui para um ambiente mais criativo e humano.”
Luiza observa que a inclusão vai muito além do cumprimento de uma exigência legal: ela promove autonomia para pessoas com deficiência, estimula a inovação nas empresas e reduz desigualdades sociais. “Essa experiência me mostrou que pessoas com deficiência não apenas merecem estar no mercado de trabalho, mas são extremamente necessárias.”
A procuradora Danielle reforça que a forma mais efetiva de inclusão no mercado de trabalho é o contrato formal de emprego, com todos os direitos assegurados. “O cumprimento da cota é essencial. Mas é preciso de fato haver uma mudança de cultura que considere e respeite o indivíduo, a pessoa, com todas as suas características”, diz.
Ela acrescenta que é fundamental oferecer adaptações razoáveis quando necessárias, disponibilizar tecnologias assistivas e cultivar um clima organizacional baseado no respeito mútuo, capaz de superar a principal barreira: a atitudinal. “Essa não depende de investimento financeiro, apenas de investimento pessoal, no reconhecimento de que todas as pessoas são plenamente capazes de realizar qualquer atividade desde que para elas sejam oferecidos os suportes e capacitações necessárias”.
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, por Sílvia Mendonça, 20.09.2025
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