Rede de fast food é condenada por assédio político a empregados

15 mar 2024

Para a 2ª Turma do TST, a interferência do empregador na liberdade de orientação política dos empregados contraria o Estado Democrático de Direito

14/03/24 – Em julgamento realizado nesta quarta-feira (13), a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, condenou a Alsaraiva Comércio Empreendimentos Imobiliários e Participações (nome fantasia da rede de fast food Habib’s), em São Paulo (SP) ao pagamento de R$ 300 mil de indenização por dano moral coletivo, por vincular seus empregados a manifestação política contra o governo federal em 2016. A relatora do recurso, ministra Maria Helena Mallmann, lembrou que o poder diretivo do empregador não abrange a imposição de convicções políticas.

“Fome de Mudança”

A ação foi apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Hotéis, Bares e Restaurantes e Similares de Águas de Lindóia e Região contra a Alsaraiva e empresas franqueadas. Segundo a entidade, a rede lançou a campanha “Fome de mudança” para incentivar a participação da população nos protestos de rua ocorridos em 13 de março de 2016, para pedir o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Ainda conforme o sindicato, buscando adesão, o Habib’s decorou suas lojas com motivos em verde e amarelo e com os dizeres “Quero meu país de volta” e disseminou a hashtag “todomundoseajudando”, além de anunciar a distribuição de adereços como fitas e cartazes aos clientes de suas lojas.

Patriotismo

Em contestação, a empresa sustentou que a mobilização não tinha relação com siglas ou coligações partidárias nem conotação político-ideológica. O objetivo seria apenas apoiar “homens e mulheres que possam fazer a diferença e trazer as oportunidades de cada brasileiro”.

Segundo comunicado do próprio presidente da empresa, a ideia da manifestação em 13 de março não era “apoiar partido A ou B”, mas mostrar patriotismo e acreditar que somente os protestos poderiam acabar com a grave crise que o país atravessava. “Estarei lá como cidadão”, ressaltou.

Na visão do Habib’s, as empresas só estariam abusando de suas liberdades se obrigassem seus empregados a usar emblemas partidários em broches ou uniformes ou a fazer panfletagem partidária junto aos clientes.

Legítima

O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Campinas (SP) e o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgaram a ação improcedente. Para o TRT, a conduta da empresa era “absolutamente legítima”. Embora reconhecendo que houve manifestação de cunho político das empresas contra o governo federal e a corrupção, o TRT entendeu que não ficou comprovada nenhuma imposição de convicções políticas aos trabalhadores.

Alteração visual

No recurso de revista, o sindicato alegou que o TRT não havia considerado que a alteração visual das lojas, por si só, vinculariam os trabalhadores à campanha de caráter político-ideológico, independentemente de outras ações. “É desnecessária a prova de coerção explícita ou do específico abalo moral individual de cada empregado”, argumentou.

Poder diretivo

Na avaliação da relatora, ministra Maria Helena Mallmann, a campanha ostensiva de cunho político-partidário no ambiente do trabalho caracteriza abuso do poder diretivo empresarial. Segundo a ministra, o abuso não se deu por imposições do uso de broches ou cartazes, mas pela vinculação da ideologia político-partidária às empregadas e aos empregados do Habib’s, que eram obrigados a participar da campanha. “O poder diretivo do empregador não contempla a imposição de convicções políticas”, afirmou.

Liberdade de orientação

Em seu voto, a ministra explica que a conduta da rede feriu preceitos da Constituição, de convenções da OIT e, no âmbito eleitoral, de resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Mallmann lembrou que a interferência do empregador na liberdade de orientação política dos empregados contraria o Estado Democrático de Direito. “O pluralismo político visa garantir a inclusão dos diferentes grupos sociais no processo político nacional, garantindo aos cidadãos liberdade de convicção filosófica e política”, explicou. Conforme a ministra, entender que o posicionamento da empresa foi “absoluto e legítimo” vai de encontro às políticas públicas voltadas à erradicação de práticas antidemocráticas.

O valor da condenação será destinado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A Alsaraiva ainda pode recorrer da decisão.

Processo: RR-Ag-10460-31.2016.5.15.0038

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, por Ricardo Reis, 14.03.2024

Os artigos reproduzidos neste clipping de notícias são, tanto no conteúdo quanto na forma, de inteira responsabilidade de seus autores. Não traduzem, por isso mesmo, a opinião legal de Granadeiro Guimarães Advogados.

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