Condições análogas à escravidão: entenda como esses casos são tratados na esfera trabalhista

15 mar 2023

O combate ao trabalho escravo envolve uma série de órgãos públicos. Casos como o registrado na Serra gaúcha, onde uma operação conjunta resultou no resgate de 180 trabalhadores, são tratados nas esferas criminal e trabalhista. Na parte criminal, cabe à Justiça Federal julgar os fatos investigados pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público Federal (MPF). A pena é de dois a oito anos de prisão e multa.

Na esfera trabalhista, os casos são conduzidos inicialmente pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Se não forem resolvidos por esses órgãos extrajudicialmente, caberá à Justiça do Trabalho julgar os fatos quando uma ação for movida. A equipe de comunicação do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) detalha, nesta matéria, como é a tramitação desses casos na esfera trabalhista.

Tramitação de casos de trabalho escravo no Ministério do Trabalho e Emprego:

– Denúncias chegam por várias formas ao MTE, entre elas, por trabalhadores, pelo MPT e por outras instituições, como PF e Polícia Rodoviária Federal (PRF);

– Em cada Superintendência Regional do Trabalho, há uma coordenação que trata do tema. Os auditores fiscais do trabalho é que são os servidores responsáveis pelas ações e fiscalizações;

– Após uma investigação prévia, é acertada uma data para realização de operação no local onde há suspeita que estejam os trabalhadores em condições análogas à escravidão. Participam auditores fiscais do trabalho, procuradores do trabalho e policiais federais e/ou rodoviários federais;

– Chegando ao local, se verifica todas as eventuais irregularidades trabalhistas;

– A primeira medida adotada é a retirada dos trabalhadores do local. Normalmente são levados para alojamentos ou hotéis por conta do empregador. Logo após, os auditores fiscais do trabalho tomam o depoimento dos trabalhadores;

– A partir desses relatos, é definida inicialmente a data da admissão, caso a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) não tenha sido assinada, ou a eventual alteração da data de admissão, caso esteja em desacordo com a prova produzida no momento;

– Os auditores fiscais fazem os cálculos do que o trabalhador tem a receber, como salários atrasados, dias trabalhados, 13º proporcional, aviso prévio indenizado, férias proporcionais, recolhimento de FGTS,  multa de 40% do FGTS e verbas rescisórias. Também se define a data desse pagamento;

– Por fim, os auditores fiscais emitem as guias de seguro-desemprego e acertam com o empregador o transporte dos trabalhadores para seus locais de origem.

Tramitação de casos de trabalho escravo no Ministério Público do Trabalho:

– Ao chegar no MPT, a denúncia é encaminhada para um(a) procurador(a) do trabalho, que ficará responsável pelo expediente na instituição;

– Denúncias de trabalho análogo ao de escravo são tratadas como prioridade na instituição;

– O(a) procurador(a) adota as medidas necessárias para investigar o caso. O MPT poderá pedir auxílio de outras instituições, como MTE, PRF e PF. Constatado o trabalho análogo à escravidão, a Procuradoria do Trabalho vai oferecer ao empregador a possbilidade de composição por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC);

– Se o empregador concordar com o TAC, o trabalhador resgatado receberá todas as verbas rescisórias e ainda uma indenização individual. Também será definido o valor que o empregador terá de pagar a título de indenização coletiva (por violar interesses da coletividade). Neste caso, essa verba é destinada a projetos sociais de instituições sem fins lucrativos ou de órgãos públicos;

– Se o empregador se recusar a firmar o TAC, o MPT ingressará com ação civil pública na Justiça do Trabalho;

– O MPT esclarece que quanto mais elementos a denúncia tiver, mais rápido será o trabalho da instituição para sua resolução;

– Procuradores(as) poderão acionar a Justiça do Trabalho antes da tentativa do TAC se entenderem que há necessidade de alguma liminar, como, por exemplo, para ingressar em algum domicílio (casos de trabalho análogo à escravidão doméstico) e bloqueio de bens de empregador suspeito dessa prática;

– As denúncias chegam ao MPT de várias formas, entre elas, pelo Disque 100 (serviço de disseminação de informações sobre direitos de grupos vulneráveis e de denúncias de violações de direitos humanos), site e e-mail da instituição. O caminho mais ágil e completo é o Sistema Ipê, que é um serviço de coleta, concentração e tratamento das denúncias de trabalho em condições análogas às de escravo no território brasileiro.

Tramitação de casos de trabalho escravo na Justiça do Trabalho:

– Casos de trabalho análogo à escravidão chegam, na sua maioria, por meio de ações civis públicas movidas pelo MPT;

– A ação é protocolada no Foro Trabalhista ou Vara do Trabalho que tem jurisdição onde o fato ocorreu;

– O magistrado marca audiência para tentativa de acordo entre as partes;

– Se não houver acordo, é realizada a instrução processual, com produção das provas, normalmente testemunhais e documentais.

– As provas são analisadas pelo juiz do processo, que profere a sentença. Ela pode ser procedente, parcialmente procedente ou improcedente;

– Da sentença, cabe recurso ordinário ao tribunal do Trabalho. No caso do Rio Grande do Sul, é o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS);

– Ao chegar ao tribunal, é sorteado um desembargador que será o relator da matéria;

– O magistrado examina o recurso ou os recursos e encaminha para julgamento da turma que ele integra;

– Uma sessão é realizada e o recurso ordinário é julgado pelo colegiado, que é composto por três desembargadores;

– Durante a sessão, as partes têm dez minutos para sustentação oral, começando por quem recorreu. Se todos recorreram, começa pelo MPT. Após, os três desembargadores apresentam seus votos e o acórdão com o resultado é proferido;

– Do acórdão, cabe Recurso de Revista ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) — nesses casos, não se discute mais os fatos, mas a eventual aplicação da lei;

– Em caso de condenação, são definidos os valores a serem pagos ao trabalhador. Além das verbas rescisórias, o empregador também pode ser condenado a pagar indenizações individuais (para aqueles trabalhadores lesados) e coletiva, por violar interesse da coletividade (neste caso, o dinheiro é destinado a projetos sociais de instituições sem fins lucrativos ou de órgãos públicos).

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 4ª Região Rio Grande do Sul, por Eduardo Matos, 14.03.2023

Os artigos reproduzidos neste clipping de notícias são, tanto no conteúdo quanto na forma, de inteira responsabilidade de seus autores. Não traduzem, por isso mesmo, a opinião legal de Granadeiro Guimarães Advogados.

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