Frigorífico é condenado a indenizar trabalhadora que contraiu covid-19 no início da pandemia

30 jun 2022

3ª Câmara do TRT-12 entendeu que empresa não fez a reposição de máscaras de forma adequada, além de outras medidas previstas em plano de contingência

A Justiça do Trabalho de SC condenou um frigorífico de Chapecó (SC) a pagar R$ 5 mil a uma empregada que contraiu o coronavírus e adoeceu em maio de 2020, três meses após o registro do primeiro caso da doença no Brasil. Segundo a decisão, a aglomeração de trabalhadores e falhas no protocolo de segurança permitem presumir que o meio laboral favoreceu o adoecimento da empregada, que precisou ficar 14 dias em casa.

Na petição apresentada à Justiça do Trabalho, a defesa da empregada argumentou que a empresa limitou-se a adotar medidas superficiais de prevenção (distribuição de álcool gel e máscaras) sem monitorar adequadamente os casos de infecção e mudar as escalas de trabalho para reduzir a aglomeração de trabalhadores nas câmaras frias, ambiente que favorece a disseminação do vírus.

Embora a empresa tenha fornecido máscaras cirúrgicas aos empregados, a petição argumenta que a reposição dos equipamentos de proteção era insuficiente, já que em ambiente frios e úmidos o tecido do material se desgasta mais rápido, o que exige sua reposição a cada duas ou três horas.

Na contestação, a empresa relatou que um terço do quadro de 2 mil funcionários chegou a ser afastado por 14 dias no período inicial da pandemia, sem nenhum corte de salário. O frigorífico informou ainda que ampliou vestiários, refeitórios e áreas de lazer, além de aumentar a equipe de saúde e estabelecer um protocolo de testagem.

Atividade essencial

O pedido de indenização foi inicialmente negado pela 4ª Vara do Trabalho de Chapecó, em dezembro do ano passado. O juízo entendeu que a empresa seguiu as recomendações do Governo Federal à época (uso de máscaras, fornecimento de álcool em gel e o isolamento de trabalhadores com sintomas) e não tinha como eliminar ou reduzir a aglomeração de trabalhadores, fator inerente à atividade.

“A empresa constitui uma das atividades essenciais à sociedade, por garantir a segurança alimentar do país. Assim, a manutenção das atividades em seu ritmo normal de funcionamento e produção caracteriza exercício regular de seu direito, não havendo ilicitude”, apontou a decisão, ponderando que empresas de transporte e supermercados passaram pela mesma dificuldade.

Ao fundamentar a decisão, o juízo afirmou que a conduta da empresa deve ser avaliada dentro do contexto de enfrentamento inicial da doença, não sendo também possível determinar se o contágio da trabalhadora ocorreu de fato dentro ou fora do frigorífico.

“A tecnologia de testagem do vírus era precária e ainda havia várias dúvidas sobre a forma de transmissão e contágio da doença. Chegar ao final da pandemia e pincelar algo que poderia ser feito aqui ou ali, sem considerar todos esses fatores, foge do razoável”, concluiu a sentença.

Ambiente inseguro

No julgamento do recurso, porém, a 3ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12) reformou a decisão, por maioria de votos. Na interpretação do colegiado, o frigorífico violou os princípios da proteção e precaução ao manter o fluxo normal de produção sem garantir a reposição adequada das máscaras e a avaliação médica de empregados afastados — medidas previstas no próprio plano de contingenciamento da empresa.

“Não há nada que indique, nos autos, que a ré acompanhou a evolução do quadro clínico da autora”, destacou a desembargadora-relatora Quézia Gonzales, frisando que a omissão colocou em risco a saúde e a vida dos demais trabalhadores. “Se o mesmo equívoco foi realizado com os demais casos, é ainda mais presumível que a sua contaminação tenha, de fato, ocorrido no ambiente de trabalho”.

Ao votar pela condenação, a relatora argumentou que a empresa não poderia ter exigido o comparecimento presencial dos trabalhadores sem assegurar a manutenção de um ambiente laboral hígido.

“A atuação irrestrita da atividade econômica, em desprezo a situações potencialmente violadoras de direitos, pelo simples argumento de que não pode ‘fechar suas portas’ não encontra guarida na ordem constitucional. É claro que nem empregados nem empregadores são culpados pela introdução do agente causador da covid-19, mas também não se pode perder de vista que a omissão em adotar determinadas medidas precaucionais acaba por agravar consideravelmente a transmissibilidade do vírus”.

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 12ª Região Santa Catarina, por Fábio Borges, 29.06.2022

Os artigos reproduzidos neste clipping de notícias são, tanto no conteúdo quanto na forma, de inteira responsabilidade de seus autores. Não traduzem, por isso mesmo, a opinião legal de Granadeiro Guimarães Advogados.

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