Médico que prestava serviços em hospital municipal como pessoa jurídica não tem reconhecido vínculo de emprego

03 maio 2021

Julgadores da Quinta Turma do TRT de Minas, por unanimidade, mantiveram sentença que negou o vínculo de emprego pretendido por um médico que prestava serviços, como pessoa jurídica, ao Hospital Municipal São Judas Tadeu, em Ribeirão das Neves. Para o desembargador Manoel Barbosa da Silva, que atuou como relator do recurso do trabalhador e cujo entendimento foi acolhido pelos demais membros da Turma, não houve fraude na contratação do profissional como pessoa jurídica (PJ), sem a presença dos requisitos da relação de emprego, o que, inclusive, foi financeiramente vantajoso para ele.

Em seu voto condutor, o relator observou que não houve qualquer vício na contratação do profissional, que prestou serviços como plantonista ao hospital por intermédio de empresa gestora de saúde pública e privada, responsável pelos repasses financeiros ao município para o pagamento do profissional. “A anulação de um negócio jurídico exige prova de erro, dolo, coação ou fraude na sua realização e no presente caso não existe prova desses vícios. Diante do grau de escolaridade do contratado e da considerável contraprestação paga, não há como reconhecer a relação de emprego entre as partes”, destacou o desembargador, na decisão.

Entenda o caso – A contratação do médico foi feita diretamente pela empresa gestora, que venceu licitação realizada pela Instituição de Cooperação Intermunicipal do Médio Paraopeba – ICISMEP, um consórcio que reúne mais de 30 municípios, incluindo o de Ribeirão da Neves. Foi por meio da empresa de gestão que o reclamante prestou serviços ao Hospital São Judas Tadeu, o qual pertence ao município de Ribeirão das Neves. A contratação incluía seis plantões semanais de 12 horas, sendo dois fixos, mediante contraprestação de R$ 1.100,00 por plantão e uma contraprestação mensal fixa de R$ 26.400,00. Na ação que ajuizou contra a empresa gestora e o consórcio intermunicipal, o médico pretendia o reconhecimento da relação de emprego com a empresa gestora, alegando que a constituição de firma individual foi condição imposta para sua contratação, embora tenha desenvolvido suas atividades com a presença dos pressupostos da relação de emprego (pessoalidade, onerosidade, subordinação e habitualidade). Pediu também a condenação subsidiária do ICISMEP pelos créditos trabalhistas decorrentes da relação de emprego. 

A empresa gestora se defendeu alegando que atuou apenas como intermediária na prestação de serviços dos médicos ao hospital municipal e repassadora da contraprestação ajustada. Sentença do juízo da Vara do Trabalho de Ribeirão das Neves-MG não reconheceu fraude na contratação do profissional por meio da pessoa jurídica, entendimento que foi mantido pelo colegiado de segundo grau, que negou provimento ao recurso do médico.

Desrespeito à Constituição – No voto, o relator ressaltou que, por se tratar de hospital público municipal, a prestação de serviços do autor deveria ter sido precedida de aprovação em concurso público de amplo recrutamento, como determina o inciso II do artigo 37 da Constituição, o que, entretanto, não ocorreu. “Criou-se o imbróglio, embora previsto em lei, envolvendo o consórcio de municípios representado pela segunda reclamada, Instituição de Cooperação Intermunicipal do Médio Paraopeba, e esta promoveu a licitação vencida pela primeira reclamada, para a contratação de médicos para atuar no serviço público de saúde, entre eles o reclamante, mediante uma pessoa jurídica”, destacou o relator.

Inexistência de fraude na contratação como PJ – Segundo o acórdão, a ilegalidade nesse tipo de contratação exige prova segura do intuito do tomador do serviço em burlar as normas de proteção ao trabalho assalariado previstas na Consolidação das Leis do Trabalho, o que, no caso, não se verificou. Nesse sentido, chamou a atenção do desembargador o fato de a contração na forma em que realizada ter sido financeiramente vantajosa para o autor, tendo em vista o elevado valor da contraprestação ajustada: “Trata-se de profissional especializado, demasiadamente esclarecido, contratado para prestar serviços ao município de Ribeirão das Neves, sem prestar concurso público, mediante uma contraprestação mensal de R$ 26.400,00, conforme consta da petição inicial, enquanto o salário profissional dos médicos, para uma jornada de duas a quatro horas, correspondente a três vezes o salário mínimo, previsto no artigo 5° da Lei n° 3.999/1961, era de R$ 2.640,00, época da celebração do contrato, considerando salário mínimo de R$ 880,00 no ano de 2016.” – pontuou.

De acordo com o desembargador, por se tratar de profissional médico, é intrínseca a pessoalidade na prestação dos serviços, assim como a contraprestação e obrigação de cumprir os plantões ajustados, circunstâncias que não bastam para caracterizar a relação de emprego, por não se tratar de um trabalhador hipossuficiente. Sobre a obrigação de cumprir os plantões contratados, explicou o julgador que isso não revela a subordinação peculiar ao contrato de trabalho, mas apenas a obrigação de entregar o serviço contratado de atendimento médico. “Trata-se de obrigação de resultado, prevista no direito civil”, registrou o relator.

O fato de o próprio autor ter reconhecido, em depoimento, que poderia trocar os dois plantões fixos por semana com o pessoal da escala, por iniciativa própria, foi considerado pelo julgador como mais um elemento revelador da inexistência da subordinação jurídica exigida no contrato de emprego.

Contribuiu para o afastamento da relação de emprego o fato de a contratação, por meio da empresa gestora, ter se mostrado mais vantajosa para o profissional do que a contratação direta pelo município de Ribeirão das Neves, seja pelo maior valor da contraprestação, seja pela maior flexibilização para o cumprimento dos plantões. Foi o que se extraiu do relato de uma testemunha.

 “A reforma de uma decisão judicial exige prova e convencimento de erro do seu prolator na interpretação da lei ou na valoração da prova dos autos. E, no presente caso, não vislumbro nenhuma dessas hipóteses”, concluiu o relator. Ele frisou que a anulação de um negócio jurídico exige prova de erro, dolo, coação ou fraude na sua realização, vícios que não estiveram presentes no caso.

PJe: 0011808-15.2017.5.03.0093

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 03.05.2021

Os artigos reproduzidos neste clipping de notícias são, tanto no conteúdo quanto na forma, de inteira responsabilidade de seus autores. Não traduzem, por isso mesmo, a opinião legal de Granadeiro Guimarães Advogados.

Compartilhar
Imagem Footer Single Post